Minhocão

Por Júlia Rachkorsky, para Condomínios e outras paixões

 

O Elevado Presidente João Goulart, mais conhecido como Minhocão, é uma das obras mais polêmicas e controversas de São Paulo. Uma via expressa de 3,5 quilômetros de extensão, que corta o centro da cidade, passando a poucos metros das janelas dos apartamentos. Durante a semana, é um símbolo do trânsito, do barulho, da poluição. Mas nos fins de semana e à noite, ele se transforma. Os carros dão lugar às pessoas, e a cicatriz de concreto vira um parque, uma passarela urbana, um espaço de lazer e de convivência. E para o nosso entrevistado, o Minhocão é um de seus lugares preferidos para caminhar.

 

Inaugurado em 1971, durante a ditadura militar, o Minhocão foi projetado para ser uma solução para o trânsito caótico da cidade. No entanto, a sua construção gerou um grande impacto na região, desvalorizando os imóveis, aumentando a poluição sonora e do ar e criando uma barreira urbana que separou bairros e comunidades. Durante décadas, o Minhocão foi visto como um erro, uma ferida aberta na paisagem da cidade.

 

Mas a partir dos anos 2000, a relação da cidade com o Minhocão começou a mudar. Os moradores do entorno começaram a se organizar para pedir o fechamento do elevado para carros e a sua transformação em um parque. Em 2015, a prefeitura atendeu à reivindicação e o Minhocão passou a ser fechado para o tráfego de veículos nos fins de semana e feriados, e durante a noite nos dias de semana.

 

A transformação foi imediata. O Minhocão foi ocupado por pedestres, ciclistas, skatistas, artistas e moradores da região. O cinza do asfalto deu lugar ao colorido das bicicletas, das roupas de ginástica, das cangas de piquenique. O barulho dos carros foi substituído pelo som das conversas, das risadas, da música. O Minhocão virou um parque linear, um espaço de lazer e de cultura a céu aberto.

 

Hoje, o futuro do Minhocão ainda é incerto. Há quem defenda o seu desmonte total, para devolver a paisagem original à cidade. E há quem defenda a sua transformação definitiva em um parque suspenso, nos moldes do High Line de Nova York. Enquanto a decisão não vem, o Minhocão segue a sua dupla vida, como via expressa e como parque.

 

Para o nosso entrevistado, caminhar no Minhocão é uma experiência única. É a oportunidade de ver a cidade por um outro ângulo, de observar a arquitetura dos prédios, de sentir o pulso da metrópole. É um exercício de ressignificação, de transformar uma cicatriz em um espaço de beleza e de encontro. É a prova de que a cidade é um organismo vivo, que se adapta, que se transforma, que se reinventa. E que, às vezes, as melhores soluções nascem dos maiores problemas.

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